30.11.11
Engraçado como às vezes temos a sensação de que determinado momento que vivemos parece ter saído de um filme ou alguma ficção. Aqueles momentos que depois de recordados nos fazem duvidar da imparcialidade da memória. Parece lógico que quando um desses absurdos acontece – em qualquer sentido, o da perfeição, do inesperado, do improvável – nós o vejamos como um momento “cinematográfico”, mágico. Mas há aí um paradoxo: justo esses momentos irreais se postos em um filme por exemplo se tornariam exagerados, piegas, desnecessários, inaceitáveis. Por quê? Porque, ao contrário das ficções que geralmente se apresentam, a realidade é por demais inverossímil. Mas essa inverossimilhança não é a dos super-poderes, super-vontades ou a da lógica dos acontecimentos. É a dos sentidos. Verossímil é aquilo que parece ser verdade, e isso a realidade jamais nos garantiu.
Por isso a ficção que se propõe realista ou naturalista ( e se apoia em um enigma ou resolução de charada) parece cair na armadilha de ter que ser justo aquilo que a realidade não é: verossímil. Aquilo que vimos, ainda que fatos concretos, é apenas uma perspectiva e nunca pode ser chamada de realidade. Assim toda tentativa de mimetizar a “vida real” se fecha em esquemas lógicos que acabam entre uma firula vaidosa e um insulto à inteligência. Sem abertura e incompletude a obra vira um desconvite, um passatempo.
Não se trata de não saber o que se quer dizer na obra e entregá-la inacabada aos outros para que a terminem mas de deixar que a poesia seja o veículo da mensagem para que nela haja espaço suficiente para caber interpretações imprevistas. A realidade é inconclusa, e por isso só a poesia e suas lacunas é capaz de a espelhar. Esses espaços abertos pela poética generosa funcionam como espelhos imprevisíveis e igualmente generosos que fazem da obra de arte um oráculo. Eis a potência maior da arte: refletir de volta aquilo que demos à obra, o nosso olhar. E essa é a imagem mais oculta e impenetrável de nós mesmos. Assim podemos nos ver a distância e descobrir quem, a partir de então, já não somos.
A arte é um atalho para os oráculos da vida. Na poesia buscamos sentido porque acreditamos haver algum. Eis o que deveríamos fazer em relação à vida.
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